A PERIGOSA ASCENSĀO DO “NACIONALISMO PREVIDENCIÁRIO” NA REGULAÇĀO DOS INVESTIMENTOS DOS FUNDOS DE PENSĀO
Sem espaço no orçamento e engessado por despesas obrigatórias que não param de crescer, o governo brasileiro quer que seus grandes fundos de pensão invistam em infraestrutura e financiem projetos de seu interesse.
Em agosto passado o próprio presidente Lula e seu ministro da fazenda, Fernando Haddad, se reuniram com os maiores players do segmento para discutir como as entidades de previdência complementar poderiam investir, por exemplo, em obras do novo PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, usando recursos que os participantes juntam para a aposentadoria.
No cardápio está desde a possibilidade de investimento em debêntures de infraestrutura (hoje vedado aos fundos de pensão), até aplicações em crédito de carbono e fundos do agronegócio (Fiagro).
Na Grã-Bretanha a primeira-ministra, Rachel Reeves, diz que herdou a pior situação fiscal desde a II Guerra e para aliviar o aperto, quer buscar a ajuda dos participantes dos fundos de pensão britânicos.
Em julho desse ano ela disse querer que os fundos de pensão do país “direcionem seus investimentos para negócios locais e proporcionem maiores retornos aos poupadores”. Seu predecessor, Jeremy Hunt, já havia aprovado regulamentação obrigando os planos de contribuição definida do Reino Unido a divulgarem (até 2027) a dimensão dos investimentos que fazem na economia local.
Outros países seguem na mesma toada.
No Canadá, Stephen Poloz - ex-presidente do Bank of Canada, o Banco Central canadense - procura meios do governo aumentar os investimentos dos fundos de pensão do país na economia doméstica.
Enrico Letta, um ex-primeiro ministro italiano, defendeu a ideia de países da Europa adotarem a adesão automática e destinarem os recursos para um fundo destinado a financiar transporte e infraestrutura de energia limpa (energia verde).
O que explica a ascensão daquilo que o The Economist rotulou de “nacionalismo previdenciário”? Porque muitos países ocidentais, exceto os EUA, vêm enfrentando esse mesmo dilema?
Altas taxas de juros e enormes dividas publicas significam que o dinheiro é escasso e quando isso acontece, diminui o nível de investimentos publico e privado nos negócios. Os tecnocratas de plantão mundo afora acham que dá para resolver isso adotando medidas que levem os fundos de pensão a preencher essa lacuna, sem prejudicar os retornos.
Um estudo feito pelos economistas - Keith Ambachtsheer, Sebastien Betermier e Chris Flynn – mostrou que os fundos de pensão canadenses investem majoritariamente no país quando se trata de renda fixa, renda variável e imóveis. Mas investem relativamente pouco em infraestrutura doméstica porque o governo não disponibiliza tais ativos para eles.
O trio propõe que o governo canadense siga o exemplo de países como Australia e Índia, que transformaram suas infraestruturas em uma classe de ativos na qual os fundos de pensão domésticos e estrangeiros possam investir.
Só tem um problema, investir mais na economia doméstica e na infraestrutura do país, não significa produzir retornos maiores. Até porque os fundos de pensão já têm por viés aplicar mais dinheiro nos mercados locais do que fora deles.
Ao longo da última década o IBOVESPA cresceu em dólar, uma média de 7% ao ano e o MSCI (índice de bolsa) do Canadá e da Grã-Bretanha apresentaram, no mesmo período, retornos de 4% e 3% ao ano respectivamente. Enquanto isso, as bolsas americanas entregaram retornos de 13% ao ano!!!
Esses mercados não tiveram performance inferior por falta de capital, mas sim porque suas bolsas são dominadas por empresas de setores como bancário, mineração e energia, todos superados pela disparada das empresas de tecnologia nos EUA.
Os países do leste asiático também podem fornecer uma lição valioso sobre os méritos do “globalismo previdenciário”, o oposto ao nacionalismo previdenciário.
Não muito tempo atrás, os governos do Japão e da Coreia do Sul mobilizaram os fundos de pensão estatais em prol de objetivos nacionais, da mesma forma que querem fazer agora os tecnocratas das Terras de Cabral, das Terras de sua Majestade e de outras Terras altas.
No entanto, preocupados com o rápido envelhecimento da população e diante de baixos retornos, mudaram de ideia. Até 2010 mais de dois terços ou 66% do patrimônio do sistema de previdência do governo do Japão (Japan Government Pension Investment Fund) e da Coreia (Korean National Pension Service) estavam aplicados em títulos dos respectivos mercados domésticos.
Hoje, esse percentual está reduzido a 30% e 40%, respectivamente. Ambos os países estão investindo mais no exterior e em ativos de maior risco. Resultado, os retornos aumentaram.
A turma da PREVIC, do ministério da fazenda e outras curiolas de tecnocratas querem limitar as classes de ativos disponiveis aos participantes de planos de previdencia complementar, impedindo os fundos de pensão brasileiros de investirem INDIRETAMENTE em ativos digitais, ou seja, em criptoativos.
Alegam ter feito análises - as quais ninguém sabe, ninguém viu - que mostram ser uma classe de ativos arriscada, indo na contramão dos avanços da economia digital abraçados pelos países desenvolvidos.
Dar aos fundos de pensão mais opções de investimento é uma coisa. Limitar as opções que eles têm para encorajar investimentos domésticos que favorecem governos, é outra totalmente diferente.
Ainda mais quando tais governos enfrentam desafios formidáveis e mal conseguem pagar a previdência social para uma população que insiste em viver indefinidamente.
Obrigar os fundos de pensão a reduzirem seu potencial retorno, inevitavelmente, deixará esses mesmos governos com a “broxa na māo”, tendo que arcar nos anos vindouros com o custo social de rendas de aposentadoria da previdência social e complementar insuficientes.
Quando isso acontecer, eles lamentarão não ter deixado os fundos de pensão investirem em ativos digitais ou outras alternativas que sob sua própria discricionaridade e gestão de riscos, lhes forneçam retornos maiores.
Todo brasileiro, inglês ou canadense que prefira alocar o $$$ de seu fundo de pensão na economia doméstica e na infraestrutura de seu país, em detrimento de outras alternativas mais interessantes, é um patriota verdadeiramente altruísta.
Perseguir investimentos internos à custa de retornos é não apenas imprudente, é ir na contramāo dos interesses dos verdadeiros donos do dinheiro (os participantes), fazendo cortesia com o chapéu alheio.
Grande abraço,
Eder.
Opiniōes: Todas minhas | Fonte: “The dangerous rise of pension nationalism”, artigo do The Economist